Artigos de Dom Manoel João Francisco Dom Manoel João Francisco - Bispo Emérito

Postado dia 06/08/2020 às 10:20:16

AGOSTO MÊS DAS VOCAÇÕES

No Brasil já virou tradição rezar pelas vocações durante o mês de agosto.

Vocação, como sabemos, é uma palavra derivada do verbo latino vocare que significa chamar. Vocação, portanto, é a resposta humana a um chamado divino. Deus nos chama e nós respondemos. A resposta é tão importante quanto o chamado.

Na Bíblia, com frequência, as pessoas relutam em atender ao chamado. Sentem-se incapazes. Deus, porém, não olha as aparências e sim o coração (1Sm 16,7). Deus não chama de forma extraordinária. Só por exceção, como no caso de São Paulo. As vocações, geralmente surgem de ambientes sadios onde se cultiva a fé.

Vocação é um termo muito amplo. Pode significar vocação à vida, vocação à santidade, vocação a um estado de vida, vocação a um ministério na comunidade eclesial e também vocação a uma determinada profissão. Cada um desses aspectos tem sua importância e merece uma reflexão.

Vocação à vida. Todos nós vivemos porque fomos chamados à existência. Ninguém vive porque decidiu viver, ou é fruto do acaso, ou de uma série de eventos caóticos. Pelo contrário, como lembra o Papa Francisco, “a nossa vida e a nossa presença no mundo são frutos de uma vocação divina”. Foi Deus quem nos chamou. Mas como o agricultor ao semear seu campo espera colher, da mesma forma Deus ao lançar o sopro vital sobre nós espera realizar seu projeto. Nós não temos o direito de frustrar o projeto de Deus. É nossa obrigação preservar a vida em nós mesmos, nas outras pessoas e na natureza. Infelizmente estamos vivendo uma cultura que pode ser chamada “cultura da morte”. Em vários países a prática da eutanásia é legalizada. Sabe-se também que o número de abortos é muito grande, tanto em países onde esta prática é permitida, quanto em países em que é proibida. No entanto, não são somente o aborto e a eutanásia que ameaçam a vida. Já quase não causam impacto as notícias sobre genocídios, mutilações, torturas, condições de vida sub-humanas, encarceramentos arbitrários, deportações, escravidão, prostituição, mercado de mulheres e jovens, degradação do meio ambiente.

Toda vocação supõe uma missão. A vocação à vida exige de nós o compromisso de defender e promover, de venerar e amar a vida. E isto, como diz São João Paulo II em sua Encíclica O Evangelho da Vida, não só em relação ao presente, mas também relação às gerações futuras (EV 42).

Vocação à santidade. São Paulo na primeira carta aos tessalonicenses diz que a vontade de Deus é a nossa santificação (1Ts 4,3). São Pedro também nos exorta: “A exemplo da santidade daquele que vos chamou, sede também santos em todas as ações” (1Pd 1,15). A vocação à santidade sempre foi necessária. Nos dias de hoje, porém, ela se faz mais urgente. Teólogos cristãos e não cristãos têm lembrado a necessidade que o mundo de hoje tem da santidade. Visitando São Paulo, em junho de 1992, o Dalai Lama, chefe do budismo tibetano declarou: “Nós, seres humanos, estamos chegando ao final do século XX. Temos um conforto material que antes não existia. Mas este progresso produziu desequilíbrio. Portanto, é superficial. Este é um tempo de espiritualidade”. Espiritualidade são os esforços e os meios que usamos para alcançar a santidade. São João Paulo II, na sua carta apostólica, “No Início do Terceiro Milênio”, ao convocar-nos para um grande mutirão de evangelização propõe como primeira tarefa a busca de santidade.

Vocação a um “estado de vida”. Esta vocação é de importância capital. Tão importante que, no linguajar comum, é nela que se pensa quando se fala de vocação. Quando alguém opta pelo casamento é bom lembrar que 24 horas por dia, durante o resto da vida, será esposa ou esposo. A mesma coisa acontece para os que escolhem a vida consagrada ou sacerdotal. No estado de vida que escolheu deverá assumir a própria vida e respeitar a vida dos outros. Deverá buscar a própria santidade e cooperar com a santificação dos outros. Daí o cuidado que se deve ter na hora de decidir por este ou por aquele estado de vida. Sendo uma vocação, é Deus quem chama. Mas o chamado de Deus acontece no ordinário da vida. Por isso é preciso que se tenha ouvidos e olhos atentos para os sinais que Deus coloca na vida de cada um.

Vocação a um ministério na comunidade eclesial.  Assumir serviços na Igreja é também uma vocação. Falando aos Apóstolos, Cristo fez questão de dizer que não tinham sido eles que o haviam escolhido, mas ele é quem os escolhera. Numa outra oportunidade exorta-nos para que roguemos ao Senhor da messe que mande operários para sua messe. Hoje na nossa Igreja temos diversos ministérios. O exercício deles supõe o chamado divino e exige a disponibilidade de quem se sente chamado. Se é graça o chamado, é graça também a resposta. Por isso só se entende vocação num clima de fé e oração.

Vocação profissional. O trabalho é uma das características que distinguem o ser humano das outras criaturas. A Palavra de Deus diz-nos que fomos criados à sua imagem e semelhança. Pelo trabalho nós transformamos e criamos novas realidades. Pelo nosso trabalho refletimos a ação do Criador. O trabalho, por isso, constitui uma dimensão fundamental da existência humana. O trabalho, no entanto, após o pecado, tornou-se ambíguo. Em vez de expressar a semelhança do ser humano com seu Criador, pode expressar também o domínio do homem pelo homem. Daí a importância de olhar o trabalho como vocação e de se escolher uma profissão que realmente nos realize. Não seria nada agradável passar oito ou mais horas por dia, durante dois terços de nossa vida, realizando uma tarefa desagradável. Não teria graça viver. A santidade, com muita probabilidade não seria alcançada e as pessoas com quem iríamos conviver, certamente, teriam a seu lado, uma pessoa mal-humorada e estressada.

Para conquistarmos algum espaço no competitivo mundo do trabalho temos de ser excelentes profissionais. Isto só é possível se o trabalho que realizamos nos traz prazer e realização pessoal. Daí a importância de uma escolha acertada no momento de se decidir por uma profissão. É dever dos pais dialogarem com os filhos, principalmente na fase da adolescência, sobre o tipo de profissão que poderão exercer. Nas escolas deve também existir o "Serviço de Orientação Vocacional". É importante que nos encontros e sessões de orientação vocacional se abra o maior leque possível de profissões. Os alunos de início, com certeza, irão ficar indecisos, mas com a presença tranquila e segura do(a) Orientador (a) eles poderão, aos poucos, fazer a opção mais adequada.

Na escolha de uma profissão, além das inclinações e dotes pessoais é preciso uma boa dose de realismo. Não adianta querer ser cantor ou cantora se nossa voz é desafinada e se não temos ouvido musical. Se não temos dinheiro para enfrentar os custos de uma faculdade de arquitetura não podemos ficar na amargura e no ressentimento. Com certeza temos qualidades e dons para outra profissão de mais fácil acesso.

Que o mês de agosto seja mais uma oportunidade de refletirmos sobre os diversos tipos de vocação e de rezarmos para que todos assumam sua vocação à vida e à santidade, tenham disponibilidade para aceitar um ministério na Igreja e luz para discernir seu estado de vida e para escolher sua profissão.

 

                                                                       Dom Manoel João Francisco

                                                                           Bispo Diocesano


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