Artigos de Dom Manoel João Francisco Dom Manoel João Francisco - Bispo Emérito

Postado dia 23/11/2016 às 15:52:56

Clausura do Ano Santo

No domingo, 21 de novembro, solenidade de Cristo Rei do Universo, o Papa Francisco, encerrou solenemente o Ano Santo da Misericórdia.

         Nesta oportunidade fui interrogado se de fato este ano da misericórdia tinha ajudado a recuperar o rosto misericordioso de Deus. Partilho com vocês o que respondi

O Ano da Misericórdia foi um apelo do Santo Padre para que pudéssemos fazer a experiência do amor de Deus. Foi um convite intenso para que cada cristão, tendo seu coração abrasado pelo encontro com Jesus e experimentado o seu perdão, se fizesse “misericordioso como o Pai”. Foi uma oportunidade para fazer emergir uma Igreja com entranhas de misericórdia que vai ao encontro de tantos feridos e necessitados de escuta, compreensão, perdão e amor.

Fica muito difícil avaliar se este objetivo foi alcançado. Exigiria uma ampla pesquisa de campo muito ampla e complexa.

Em todos os casos, se pode dizer que o apelo feito em Bangui, capital da República Centro Africana, para que as armas fossem depostas, parece ter caído no vazio. Os muitos pedidos em favor dos migrantes também não foram ouvidos. Esses irmãos continuam sendo abandonados. No que diz respeito às relações entre as nações, o gesto mais significativo foi, sem dúvida, a visita do Presidente dos Estados Unidos a Cuba, acontecido sob a mediação do Papa Francisco. Foi a primeira vez, desde 1928, que um presidente norte-americano pisou em solo cubano. Ainda em Cuba, uma nota do Conselho de Estado anunciou um indulto para 787 presos, “mulheres, jovens, doentes e outras categorias”, atendendo um pedido do Papa Francisco, motivado pelo Ano Santo da Misericórdia.

Apesar desse aparente insucesso, é preciso dizer que a publicação da Exortação Pós-Sinodal Amoris Laetitia, com sua ampla recepção pelo povo fiel e também pela grande maioria do episcopado do mundo inteiro, tem ajudado muito para recuperar o rosto misericordioso de Deus. Acolhendo as palavras do Papa: “Convido os pastores a escutar com afeto e serenidade, com o desejo sincero de entrar no coração do drama das pessoas e compreender seus pontos de vista, para ajudá-las viver melhor e reconhecer seu próprio lugar na Igreja” (AL 312), várias Conferências Episcopais, inclusive a nossa CNBB, elaboraram orientações pastorais inspiradas no que o Papa havia afirmado alguns parágrafos antes: “Embora seja verdade que é preciso ter cuidado com a integralidade da doutrina moral da Igreja, todavia sempre se deve pôr um cuidado especial em evidenciar e encorajar os valores mais altos e centrais do Evangelho, particularmente o primado da caridade como resposta à iniciativa gratuita do amor de Deus. Às vezes, custa-nos muito dar lugar, na pastoral, ao amor incondicional de Deus. Pomos tantas condições à misericórdia que a esvaziamos de sentido concreto e real significado, e esta é a pior maneira de frustrar o Evangelho. É verdade, por exemplo, que a misericórdia não exclui a justiça e a verdade, mas, antes de tudo, temos de dizer que a misericórdia é a plenitude da justiça e a manifestação mais luminosa de Deus. Por isso, convém sempre considerar inadequada qualquer concepção teológica que, em última instância, ponha em dúvida a própria onipotência de Deus e, especialmente, a sua misericórdia” (AL 311).

Os Motu Proprio Mitis Iudex Dominus Iesus  para a nossa Igreja do Ocidente e Mitis et Misericors Iesus para a Igreja Oriental que entraram em vigor no dia 08 de dezembro do ano passado, o mesmo dia em que teve início o Ano Santo da Misericórdia, tornando mais simples e breves os processos de declaração de nulidade dos matrimônios, têm sido, com certeza, manifestação muito significativa do rosto misericordioso de Deus, principalmente às famílias. É de se esperar que muitas pessoas, que estavam vivendo uma experiência matrimonial infeliz, tenham, no Ano Santo da Misericórdia, entoado o Salmo dos exilados (126,1-2): “Quando o Senhor trouxe de volta os exilados de Sião, pensávamos que era um sonho. Então nossa boca transbordava de sorrisos e nossa língua cantava de alegria”.

Mesmo sem dados concretos, tudo indica que o Ano Santo da Misericórdia ajudou a Igreja a centrar-se sempre mais em Jesus, Rosto da Misericórdia do Pai e na experiência do perdão curador. Parece que se tornou mais viva a necessidade de ser Igreja samaritana (Lc 10, 30-37), capaz de envolver-se com a dor do outro, daquele que sofre e, em especial, daqueles que tiveram suas forças e voz caladas, os caídos e marginalizados de nosso tempo.


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