Artigos de Dom Manoel João Francisco Dom Manoel João Francisco - Bispo Emérito

Postado dia 17/11/2016 às 09:23:50

Cristo Rei

No próximo domingo, além de ser solenidade de Cristo Rei, padroeiro de nossa Catedral, vamos celebrar também o encerramento do Ano Santo da Misericórdia, proclamado pelo nosso Papa Francisco.

Para marcar a data uma revista de teologia de Passo Fundo, RS resolveu dedicar a próxima edição sobre este evento. Entre os vários artigos, resolveu publicar uma entrevista comigo. Foram várias perguntas. Resolvi partilhar com vocês que me acompanham toda semana e também com os que esporadicamente me encontro neste meio de comunicação, o que respondi na primeira pergunta.

O que significa o ano jubilar para a Igreja e qual o sentido de se proclamar um Jubileu Extraordinário?

A origem do jubileu é bíblica. Conforme o livro do Levítico a cada 50 anos o povo de Israel deveria proclamar um Ano Santo. Neste ano todos os que eram escravos no país deviam ser libertados. As propriedades eram restituídas aos primitivos donos, não se semeava nada e as pessoas comiam do que tinham colhido no ano anterior, ou do que produzissem os campos não cultivados (Lv 25, 1-55). Por isso o Ano Santo devia ser cheio de atos de confraternização e de muita alegria.

         Em sua primeira pregação na sinagoga de Nazaré, Cristo faz uma releitura da proposta do Ano Santo. Em vez de ser celebrado apenas de tempos em tempos, o Ano Santo deveria se realizar “hoje”, ou seja, na cotidianidade da vida (Lc 4, 18-21) . Por isso, somente a partir do ano 1300, a Igreja católica reiniciou a tradição do Ano Santo. A intenção era celebrá-lo cada 100 anos. Mas, quase imediatamente apareceu o desejo de seguir o costume bíblico de 50 anos entre uma e outra celebração. Após 1475, a periodicidade dos Anos Santos passou a ser de 25 anos.

 O Ano Santo pode ser ordinário ou extraordinário. Ordinário, quando acontece dentro do previsto, ou seja, a cada 25 anos. Já o extraordinário se dá, quando o Papa deseja celebrar uma data especial, ou chamar nossa atenção para uma dimensão da fé e da espiritualidade cristã. É o caso do Ano Santo da Misericórdia que estamos vivendo.

Até hoje já houve 26 Anos Santos ordinários e apenas três extraordinários. Um em 1933, proclamado pelo Papa Pio XI, para celebrar o 19º Centenário da Redenção. O outro em 1983, proclamado pelo Papa São João Paulo II. A celebração de um Ano Santo extraordinário no 1950º aniversário da Redenção, na intenção de São João Paulo II, deveria provocar nos fiéis católicos a consciência de que a sua condição privilegiada de filhos e filhas de Deus “não se deve atribuir aos próprios méritos, mas sim a uma graça especial de Cristo; pelo que, se a ela não corresponderem com os pensamentos, palavras e ações, bem longe de se salvarem, serão antes mais severamente julgados” (Bula de Promulgação).

O terceiro Ano Santo extraordinário é o que estamos vivendo, proclamado pelo Papa Francisco. Sua intenção é celebrar o 50º aniversário de clausura do Concílio Vaticano II. De acordo com suas palavras “a Igreja sente necessidade de manter vivo aquele acontecimento”, pois a partir dele “a Igreja sentiu a responsabilidade de ser, no mundo, o sinal vivo do amor do Pai”.  No dia 09 de dezembro de 2015, em sua audiência pública, na Praça de São Pedro, o Papa Francisco assinalou que “Igreja precisa deste momento extraordinário, pois a misericórdia é uma necessidade imperiosa nas instituições e na Igreja, em primeiro lugar”.

 Num tempo, o nosso, em que “se festeja a morte de um jovem que talvez tenha errado o caminho, em que se prefere a guerra à paz, em que se difunde a xenofobia, em que ganham terreno as propostas intolerantes e a crueldade se massifica”, a Igreja não pode ficar indiferente. Ela se sente chamada de maneira muito intensa a mostrar ao mundo a presença e a proximidade de Deus, fixando o olhar na misericórdia que, embora esquecida, é sem dúvida, o melhor remédio, o melhor antídoto. “É muito melhor que os antidepressivos e os ansiolíticos. Muito mais eficaz do que os muros, as grades, os alarmes e as armas. Com a vantagem de ser grátis, pois é dom de Deus” (Papa Francisco, III Encontro Mundial dos Movimentos Populares). Na cerimônia de abertura da Porta Santa na catedral de Bangui (República Centro-Africana), o Papa faz um sério chamamento a “todos os que injustamente empunham as armas deste mundo”, pedindo para que deponham “estes instrumentos de morte” e conclamando para que “se armem antes com a justiça, o amor e a misericórdia, garantias autênticas de paz”. Este é o sentido deste Ano Santo da Misericórdia: ser um “tempo favorável para a Igreja, a fim de se tornar mais forte e eficaz o testemunho dos crentes”; trazer de novo à nossa memória as palavras que o Papa São João XXIII pronunciou por ocasião da abertura do Concílio Vaticano II: “Nos nossos dias, a Esposa de Cristo prefere usar mais o remédio da misericórdia que o da severidade”. Na audiência, na Praça de São Pedro, do dia 14 de outubro de 2014, o Papa afirmou: “É necessário que os cristãos tornem visível aos homens de hoje a misericórdia de Deus, sua ternura por cada criatura. Todos sabemos que a crise da humanidade contemporânea não é superficial, é profunda. Por isso, a nova evangelização (...) não pode deixar de usar a linguagem da misericórdia, feita de gestos e de atitudes mais do que de palavras”. Sem dúvida, o Ano Santo do Jubileu extraordinário da Misericórdia é um grande dom para o mundo e para a Igreja uma graça extraordinária. É um tempo oportuno para mostrar o rosto amoroso do Pai que se fez anúncio de amor e salvação em Jesus. É uma oportunidade para levar a todos a fazerem uma experiência de Deus através de sua misericórdia e perdão. É um tempo de júbilo, de alegria, de festa. É um momento singular na vida da Igreja para chamar todas as pessoas de boa vontade a voltarem-se ao Senhor, a experimentarem em suas vidas, marcadas pelo pecado, o amor das entranhas de Deus.


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