Artigos de Dom Manoel João Francisco Dom Manoel João Francisco - Bispo Emérito

Postado dia 07/07/2016 às 14:54:06

Misericórdia

O evangelho previsto para ser proclamado nas celebrações do próximo domingo ganha especial importância neste Ano Santo da Misericórdia que estamos vivendo. Trata-se da Parábola do Bom Samaritano, narrada por Jesus, quando perguntado por um “Mestre da Lei” “quem seria o seu próximo”. Em sua resposta Jesus deixa claro que o mais importante, não é saber quem é nosso próximo, mas de quem nós somos próximos.

         Na proposta de Jesus, o próximo é todo ser humano que sofre e necessita de ajuda, seja conhecido ou desconhecido. Aqui está uma novidade radical. O normal é fazer o bem a parentes e conhecidos. Até porque, sempre haverá a possibilidade de sermos retribuídos em caso de necessidade. Fazer o bem sem olhar a quem é próprio de Deus que “faz nascer o sol sobre bons e maus e faz cair a chuva sobre justos e injustos” (Mt 5,45). Portanto, se quisermos atender a ordem de Jesus: “vai e faze a mesma coisa”, precisamos ser tocados pela graça de Deus e nos deixar converter. Esta é uma graça que se alcança através da oração, a exemplo de Santa Faustina Kowalska que compôs e rezava com freqüência esta bela oração:

 

“Senhor, desejo transformar-me toda em vossa misericórdia, para tornar-me o vosso reflexo vivo.

Que a vossa misericórdia, que é insondável e de todos os atributos de Deus, o mais sublime, se derrame do meu coração e da minha alma sobre o próximo.

Ajudai-me, Senhor, para que os meus olhos sejam misericordiosos, de modo que eu jamais suspeite, nem julgue as pessoas pela aparência externa, mas perceba a beleza interior dos outros e possa ajudá-los.

Ajudai-me, Senhor, para que os meus ouvidos sejam misericordiosos, de modo que eu esteja atenta às necessidades de meus irmãos e não me permitais permanecer indiferente diante de suas dores e lágrimas.

Ajudai-me, Senhor, para que minha língua seja misericordiosa, de modo que eu nunca fale mal dos meus irmãos; que eu tenha para cada um deles palavras de conforto e de perdão.

Ajudai-me, Senhor, para que as minhas mãos sejam misericordiosas e transbordantes de boas obras, que elas nunca se cansem de fazer o bem aos outros, enquanto, aceite para mim as tarefas mais difíceis e penosas.

Ajudai-me, Senhor, para que sejam misericordiosos também os meus pés, para que levem sem descanso ajuda aos meus irmãos, vencendo a fadiga e o cansaço.

Ajudai-me, Senhor, para que o meu coração seja misericordioso e se torne sensível a todos os sofrimentos do próximo.

Senhor, adiantai-vos e aumentai em mim, sem cessar, a vossa misericórdia, a fim de que eu possa cumprir fielmente a vossa santa vontade, durante toda a minha vida e na hora da morte. Amém!”

 

         Além da oração, precisamos também nos inspirar no exemplo dos santos e das santas. Lembro apenas um, cuja vida me impressiona sobremaneira, desde que, ainda adolescente, li sua biografia.

 

São Damião de Veuster, Pai e Servo dos leprosos.

Na ilha de Molokai viviam em situação degradante os leprosos do Havaí. Como os próprios moradores diziam: naquele lugar, não havia lei. Os leprosos, depois de capturados a força, eram para ali levados, e ali viviam num misto de revolta, desespero e ódio.  Os mortos eram abandonados ao ar livre e devorados pelos porcos e pelas aves de rapina.

Com alma dilacerada perante tanta miséria, Padre Damião ofereceu-se para testemunhar a misericórdia de Deus no meio de tamanha dor. O bispo, dom Maigret aceitou a oferta do Pe. Damião na certeza de que aquele gesto equivalia a uma sentença de martírio. Por isso, acompanhou o missionário até a “ilha maldita”. Assim era conhecida a ilha de Molokai. Lá chegando, o Bispo dirigiu-se aos leprosos com estas palavras: “Até agora, meus filhos, vocês estiveram abandonados e sem ajuda nenhuma. Mas não será mais assim; trouxe-lhes alguém que lhes será como um pai, alguém que os ama tanto que, pelo bem estar de todos e pela salvação de suas almas imortais, não hesitou em tornar-se um de vocês, a fim de viver e morrer aqui”.

Pe. Damião não desmentiu as palavras do Bispo. Ao chegar, de imediato percebeu a amplitude de sua missão. Além da pregação e celebração dos sacramentos, devia providenciar água, alimentos, remédios, casas e especialmente atenção e carinho. Uma de suas primeiras ações foi escolher um lugar e abençoá-lo como cemitério, a fim de dar uma sepultura digna e cristã para todos. Durante o tempo que ali ficou, praticamente sozinho, cuidou de 3.137 leprosos, dos quais 2.312 faleceram e foram sepultados por ele. Sem nenhuma ajuda construiu 300 cabanas e fez dois mil caixões com as próprias mãos. Transcorridos 11 anos de atividade a ilha estava totalmente renovada.

Não foi fácil, mas com a graça de Deus, viveu a misericórdia em grau máximo junto dos leprosos de Molokai. Que São Damião Veuster interceda por nós, para que, neste Ano Santo da Misericórdia, passemos a ter a misericórdia como princípio de toda a nossa ação e nossa vida cristã.


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