Artigos de Dom Manoel João Francisco Dom Manoel João Francisco - Bispo Emérito

Postado dia 17/03/2016 às 14:48:55

Domingo de Ramos

O próximo Domingo é conhecido na liturgia católica como “Domingo de Ramos ou da Paixão do Senhor. Com esta celebração estaremos iniciando um período muito intenso da vida cristã: a Semana Santa. É santa porque nestes dias nós celebramos os mistérios mais sublimes e santos da nossa fé. Os cristãos de rito bizantino chamam esta semana de “A Grande Semana”, significando que durante estes dias celebram-se os grandes, os maiores mistérios da fé. Eles, os cristãos de rito bizantino, fazem jejum a semana inteira. Para eles, o jejum consiste em não sentar-se a mesa para uma refeição completa. Passam os dias enganando o estômago com pequenos bocados de comida. Encerram o jejum na noite de Páscoa, depois da meia noite com uma solene ceia, onde não pode faltar um cordeiro assado.

         Voltemos ao Domingo de Ramos. Como vimos, este domingo também é chamado da “Paixão do Senhor”. Trata-se de duas tradições litúrgicas que se fundiram na Igreja de Roma no final do século X.

         A celebração de Ramos tem origem na Igreja de Jerusalém. Etéria, uma monja espanhola, que peregrinou para Jerusalém, por volta do ano 400, faz um belo relato desta celebração. Eis o que ela nos conta:

         “No dia seguinte, isto é, no domingo em que se entra na semana pascal aqui chamada de semana maior (...). À sétima hora (uma da tarde), todo o povo, e também o bispo, sobe à igreja do monte das oliveiras, isto é Eleona; recitam hinos e antífonas adequados a esse dia e lugar e igualmente leituras. Por volta da nona hora (três da tarde), entoando hinos, sobem ao Imbomon, isto é, ao sítio de onde subiu o Senhor aos céus, e aí se sentam. Todo o povo, estando sempre presente o bispo, é convidado a sentar-se e só os diáconos permanecem o tempo inteiro de pé. Também aí recitam hinos e antífonas apropriados ao lugar e ao dia e, igualmente leituras intercaladas e orações. Aproximando-se a undécima hora (cinco da tarde), lêem a passagem do Evangelho, segundo o qual as crianças correram ao encontro do Senhor com ramos e palmas dizendo: “Bendito seja o que vem em nome do Senhor” (Mt 21,8-9). Levantam-se, imediatamente, o bispo e todo o povo e, do alto do monte das Oliveiras, descem todos a pé. E caminha todo o povo à frente do bispo, entoando hinos e antífonas e repetindo sempre: “Bendito seja o que vem em nome do Senhor”. E todas as crianças da região, até mesmo as que, pela pouca idade, não podem andar pelos próprios pés e que os pais carregam ao colo, todas levam ramos, umas de palmas, outras de oliveira; e acompanham o bispo tal como foi acompanhado o Senhor (Mt 21,8)”.

         Na mesma época, que se celebrava o “Domingo de Ramos” em Jerusalém, em Roma se celebrava o “Domingo da Paixão”. Os sermões do Papa São Leão Magno demonstram com evidência esta prática. Lia-se a Paixão segundo São Mateus, e o Papa fazia o comentário .durante o sermão.

No final do século VII o “Domingo de Ramos” já era celebrado também nas Igrejas do Ocidente. No entanto, por alguns séculos, as duas celebrações são feitas de forma paralela, sem se misturar, até que, antes do ano 1000, através da Espanha e da França, elas se encontram em Roma. A liturgia romana da Paixão, parecia muito austera para as novas gerações cristãs, resultantes da fusão entre a cultura romana e a cultura dos povos vindos do norte. Até hoje, não houve uma fusão completa das duas celebrações. O título do Domingo é prova disto: “Domingo de Ramos ou da Paixão do Senhor”. Ainda bem que, durante a celebração, não se troca a cor dos paramentos, do vermelho para o roxo, como acontecia antes da reforma litúrgica prescrita pelo Concílio Vaticano II.

 Como proposta de vida, o “Domingo de Ramos ou da “Paixão do Senhor”, com seus cantos e hinos a Cristo Rei, redentor, nos pede para não contemplarmos de forma dolorista a Paixão de Senhor. Deter-se na Paixão, apenas no seu aspecto doloroso seria a não compreensão dos sofrimentos de Cristo e dos sofrimentos que o ser humano deve suportar em sua vida e história. A Paixão de Cristo deve ser contemplada a partir de sua ressurreição e gloriosa ascensão ao céu. É o que expressa o livro dos Atos dos Apóstolos quando diz: Deus constituiu Senhor e Cristo a este Jesus que vós crucificastes” (At 2,36). O “Domingo de Ramos ou da Paixão do Senhor”, com seu aspecto festivo em meio a dor e ao sofrimento quer inserir na experiência dos cristãos a certeza de que a morte não tem a última palavra. A última palavra pertence ao amor, à bondade e à misericórdia. Se é verdade que o Filho do homem foi humilhado e desprezado, é também verdade que agora ele está glorificado por Deus como Messias-Rei (cf. Sl 110,1).


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